Crônica Publicada no Diário De Pernambuco
26 de dezembro de 2009
CAMPEÕES DO MUNDO
Meraldo Zisman
Psicoterapeuta de Jovem
Somos os campeões, no mundo das cesarianas: no Brasil, 80% dos partos realizados pela clientela dos planos de saúde são por cesariana. No Sistema Público de Saúde (SUS), esse índice é bem mais baixo: 26%. Mesmo assim, está acima dos 15% recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Portanto, alguma coisa deve estar acontecendo com nossas gestantes, com o Sistema de Saúde, com os médicos, com a formação profissional, ou, além disso, com grande interesse comercial.
Das menores às mais importantes maternidades, as estatísticas apontam para um número crescente de nascimentos por via abdominal, quando a via natural de nascimento é a vaginal. E observa-se que tal tendência só vem aumentando. Isto dá margem à publicação de inúmeros trabalhos especializados, irritantemente repetitivos, e pior: que não apontam soluções.
As cesarianas, como qualquer procedimento médico, têm indicações e contra-indicações. Quando assisto a um comercial - que apresenta uma bela senhora (com um biótipo completamente diferente da maioria de nossas gestantes), sentada em uma confortável poltrona, e afirmando que o parto normal é maravilhoso, que ela teve um casal de gêmeos através de um "parto normal" - fico pensando se, não seria melhor, trocar a designação correta de parto normal para a de parto espontâneo. É importante se saber que gestação não é doença. O Ministério da Saúde divulga a informação, bem como a necessidade de que todos partos, quando possíveis, devem ser espontâneos.
Em se tratando de propaganda, a rádio BBC de Londres divulga, no tocante aos hospitais da cidade, a seguinte notícia: Médicos humanizam cesarianas para torná-las menos traumáticas. A reportagem é de Flávia Mantovani, da Folha de São Paulo, em 24/12/ 2008, às 15h 47 minutos. Apesar de os índices de partos cesarianos, na Grã-Bretanha, serem muito mais baixos que os brasileiros, os ingleses estão tentando realizar uma cesariana mais light. Neste sentido, melhoraram as salas de cirurgia, e o ambiente foi todo montado, artificialmente, para simular o momento sublime do nascimento. Acende-se, apenas, o foco de luz da lâmpada do aparelho operatório, na sala reina o máximo de silêncio possível, e a única voz que se ouve, de vez em quando, é a do cirurgião, sussurrando à mãe-paciente sobre os procedimentos realizados. (...) O bebê é retirado, com muita calma, de modo a simular as condições de um parto normal, seus pulmões são comprimidos, gentilmente, de forma similar à ocorrida no canal vaginal, mediante as contrações, e que ajuda a eliminar o líquido amniótico. O contacto com a mãe e com o pai é o mais precoce possível.
Em cinqüenta anos de prática da Medicina, como neonatologista, eu realizei esses mesmos procedimentos, no Hospital Agamenon Magalhães pertencente ao então IAPI (Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Industriários). Os jovens que comigo trabalhavam aprenderam, também, a fazer tais procedimentos. E jamais alguém fez qualquer propaganda do nosso trabalho. Nos dias de hoje, observa-se a existência de luminares da obstetrícia, cobrando uma verdadeira fortuna por um parto humanizado (ou uma cesariana humanizada). E eles são endeusados, fantasticamente, pelos meios de comunicação de massa. Vale ressaltar que a Medicina já nasceu humanizada. Falta, somente, tornar os médicos mais humanos.
Sei que esse tema é muito antigo, mas, repito sempre: não existe um assunto esgotado e, sim, homens e mulheres cansados. Faz-se necessário melhorar o pré-natal, os cuidados maternos, as instalações hospitalares, o atendimento médico, e, então, o número de partos por cesariana irá diminuir, automaticamente. No Brasil, temos um dos maiores índices de mortalidade materna do mundo. Portanto, não dá para não perguntar: Será que não há, por acaso, algo de podre nesse reino
26 de dezembro de 2009
CAMPEÕES DO MUNDO
Meraldo Zisman
Psicoterapeuta de Jovem
Somos os campeões, no mundo das cesarianas: no Brasil, 80% dos partos realizados pela clientela dos planos de saúde são por cesariana. No Sistema Público de Saúde (SUS), esse índice é bem mais baixo: 26%. Mesmo assim, está acima dos 15% recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Portanto, alguma coisa deve estar acontecendo com nossas gestantes, com o Sistema de Saúde, com os médicos, com a formação profissional, ou, além disso, com grande interesse comercial.
Das menores às mais importantes maternidades, as estatísticas apontam para um número crescente de nascimentos por via abdominal, quando a via natural de nascimento é a vaginal. E observa-se que tal tendência só vem aumentando. Isto dá margem à publicação de inúmeros trabalhos especializados, irritantemente repetitivos, e pior: que não apontam soluções.
As cesarianas, como qualquer procedimento médico, têm indicações e contra-indicações. Quando assisto a um comercial - que apresenta uma bela senhora (com um biótipo completamente diferente da maioria de nossas gestantes), sentada em uma confortável poltrona, e afirmando que o parto normal é maravilhoso, que ela teve um casal de gêmeos através de um "parto normal" - fico pensando se, não seria melhor, trocar a designação correta de parto normal para a de parto espontâneo. É importante se saber que gestação não é doença. O Ministério da Saúde divulga a informação, bem como a necessidade de que todos partos, quando possíveis, devem ser espontâneos.
Em se tratando de propaganda, a rádio BBC de Londres divulga, no tocante aos hospitais da cidade, a seguinte notícia: Médicos humanizam cesarianas para torná-las menos traumáticas. A reportagem é de Flávia Mantovani, da Folha de São Paulo, em 24/12/ 2008, às 15h 47 minutos. Apesar de os índices de partos cesarianos, na Grã-Bretanha, serem muito mais baixos que os brasileiros, os ingleses estão tentando realizar uma cesariana mais light. Neste sentido, melhoraram as salas de cirurgia, e o ambiente foi todo montado, artificialmente, para simular o momento sublime do nascimento. Acende-se, apenas, o foco de luz da lâmpada do aparelho operatório, na sala reina o máximo de silêncio possível, e a única voz que se ouve, de vez em quando, é a do cirurgião, sussurrando à mãe-paciente sobre os procedimentos realizados. (...) O bebê é retirado, com muita calma, de modo a simular as condições de um parto normal, seus pulmões são comprimidos, gentilmente, de forma similar à ocorrida no canal vaginal, mediante as contrações, e que ajuda a eliminar o líquido amniótico. O contacto com a mãe e com o pai é o mais precoce possível.
Em cinqüenta anos de prática da Medicina, como neonatologista, eu realizei esses mesmos procedimentos, no Hospital Agamenon Magalhães pertencente ao então IAPI (Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Industriários). Os jovens que comigo trabalhavam aprenderam, também, a fazer tais procedimentos. E jamais alguém fez qualquer propaganda do nosso trabalho. Nos dias de hoje, observa-se a existência de luminares da obstetrícia, cobrando uma verdadeira fortuna por um parto humanizado (ou uma cesariana humanizada). E eles são endeusados, fantasticamente, pelos meios de comunicação de massa. Vale ressaltar que a Medicina já nasceu humanizada. Falta, somente, tornar os médicos mais humanos.
Sei que esse tema é muito antigo, mas, repito sempre: não existe um assunto esgotado e, sim, homens e mulheres cansados. Faz-se necessário melhorar o pré-natal, os cuidados maternos, as instalações hospitalares, o atendimento médico, e, então, o número de partos por cesariana irá diminuir, automaticamente. No Brasil, temos um dos maiores índices de mortalidade materna do mundo. Portanto, não dá para não perguntar: Será que não há, por acaso, algo de podre nesse reino
que grande prazer em encontrá-lo pela internet.
ResponderExcluirDr. Meraldo, o senhor foi pediatra de meus filhos quando moravamos em Recife. Hoje vivemos em SP, mas nunca esqueci do senhor. Um grande abraço. Seus pacientes estão hoje com 42 Rodolfo Lopes e Carmem Lucia com 40 .
Darcy Lopes.
Dr. Meraldo meu e-mail é lopesdarcy@yahoo.com.br
ResponderExcluirDarcy Lopes