sábado, 24 de abril de 2010

PEDOFILIA


PEDOFILIA

MERALDO ZISMAN
PSICOTERAPEUTA DE JOVEM



A sociedade, como tudo que a envolve - crianças, adolescentes, cultura, sexo e religião - faz do assunto pedofilia uma matéria sensacionalista. Por sua vez, a mídia reflete o que o publico deseja assistir. Este é seu papel e dever: vigiar, informar, denunciar. Como todos os atos e engenhos humanos, ela possui falhas e virtudes. No meu entender, porém, sem liberdade de imprensa morreremos todos por asfixia.
Quando o caso é o celibato da Igreja Católica Romana (do qual não sou defensor por razões, até, fisiológicas) e a pedofilia, nada me impede, como um psicoterapeuta de origem judaica, de não enxergar alguma relação entre padres portadores deste distúrbio e, muito menos, de entender a comparação desastrada desta patologia com o preconceito anti-judaico. Preconceito este que levou à Inquisição, aos pogroms (palavra russa que significa "causar estragos, destruir violentamente. Historicamente, o termo se refere aos violentos ataques físicos das populações européias contra os judeus, tanto no império russo quanto em outros países), e que culminou com o Holocausto.
Dado às minhas raízes judaicas, eu considero um absurdo a comparação que se faz, atualmente, à Igreja Católica, associando as críticas aos padres pedófilos com as ações dos anti-semitas contra o povo hebreu. Quem assim pensa desrespeita tanto as crianças abusadas sexualmente, quanto os seis milhões de judeus que foram mortos e queimados nos fornos crematórios nazistas.
Dito isto, aviso a quem me lê, agora, e não me conhece. Exerço a Pediatria e a Psicoterapia, há mais de 50 anos e lembro ser ela um transtorno de personalidade e de preferência sexual que se caracteriza pela escolha sexual por crianças, quer se trate de meninos ou meninas, geralmente pré-púberes ou no início da puberdade. Conferir: CID-10 - Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde -, Organização Mundial de Saúde (OMS). O DSM-IV (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorder utiliza a classificação dos transtornos mentais da Associação Americana de Psiquiatria, que condiciona o diagnóstico deste transtorno mental às pessoas com idades de 16 anos ou 17 anos que são, pelo menos, 5 anos mais novas do que as crianças abusadas.
O portador de tal perturbação tem pensamentos e fantasias eróticas repetitivas, ou atividade sexual com crianças menores de 12 ou 13 anos de idade. A pedofilia está comumente associada a casos de incesto: a maioria dos casos envolve pacientes da mesma família (pais/padrastos com filhos e filhas). Via de regra, o ato pedófilo consiste em toques, carícias genitais e sexo oral, sendo a penetração menos comum.
Com a expansão da internet, tem sido mais freqüente a presença de pedófilos que apreciam fotos de crianças, com a finalidade de se excitar e/ou se masturbar. No meu entender, a história da pedofilia não deve incluir, apenas, o escândalo dos padres católicos (0,6% dos clérigos). Tampouco na falsa associação com o Holocausto, ou no esquecimento deste. Solicito uma trégua. Não escrevo esta crônica para me indignar. Tento contribuir para o debate do momento, com observações sugeridas pela Psicopatologia e pela clínica de Pediatria.

Publicado no Direto da Redação e Diário de Pernambuco.

Pediatra Fernando Azevedo


Pediatra Fernando Azevedo
Meraldo Zisman
Psicoterapeuta de Jovéns


No dia 24 de março de 2010 recebi o seguinte e-mail:


“Meus Caros Amigos,

A Associação Médica de Pernambuco comunicou-me, ontem, que fui escolhido para ser homenageado, juntamente com dois outros colegas, no dia 6 de abril, às 20 horas, e receber, nessa reunião, a medalha de condecoração Maciel Monteiro. Sinto-me honrado com a homenagem e, feliz, com a presença de vocês. Um abraço.”

O texto não estava assinado. No entanto, diante daquela mensagem, ressalto que meu contentamento foi grande. Meu caro Fernando, independentemente da amizade que lhe tenho, para mim, você é e será, sempre, o pediatra que os outros recomendam, assemelhando-se ao médico pernambucano, patrono da comenda que lhe será outorgada.

Permitam-me, leitores, rememorar o patrono Maciel Monteiro (Antônio Peregrino M. M., 2º. Barão de Itamaracá), o médico, jornalista, diplomata, político, orador e poeta, que nasceu no Recife/PE, em 30 de abril de 1804, e faleceu em Lisboa/Portugal, em 5 de janeiro de 1868. Ele é o patrono da Cadeira no. 27, escolhido pelo fundador Joaquim Nabuco. Meu caro homenageado: como você foi cordato, alegre, distinto, delicado, amável, diplomata, e, sobretudo, pernambucano! Essa foi a impressão que deixou, aonde nós aprendemos a difícil Medicina Infantil, no Hospital dos Servidores do Estado, no Rio de Janeiro. Tivemos os mesmos mestres e somos irmãos de profissão.

No presente, mesmo dedicando-me à psicoterapia, é grande a minha exultação ao ver você receber tamanha distinção! Em que peito, mais nobre que o seu, a medalha do Barão de Itamaracá poderia ter mais altiva guarida?

Fernando Azevedo, você é nobre em origem e sentimentos. O seu dom mágico, de vivenciar com tamanho carinho e competência a relação médico/criança/família, é logo percebido pelas mães. Seu consultório é o mesmo: sempre repleto de brinquedos e de amor. Você sabe melhor do que ninguém que, o trabalho das crianças, é o eterno brincar; e que, brincando, é que elas apreendem o mundo. Poucos são os adultos que têm consciência disso!

Como você, alguns conservam a criança que existe dentro de nós. Por essa razão, a Medicina Pernambucana, ao prestar essa homenagem, estende os parabéns, ainda, àqueles médicos vocacionados que exercem a profissão com amor. Ao lhe outorgar a medalha de condecoração Maciel Monteiro, a Associação Médica de Pernambuco está de parabéns! Meu caro Fernando Azevedo, muito obrigado por permitir que eu seja seu amigo!

*Crônica publicada no Diario de Pernambuco em 4 de Abril de 2010




O MOLHO DE MAIONESE


O MOLHO DE MAIONESE

Meraldo Zisman

Psicoterapeuta





O gênero humano jamais poderia imaginar que os e-mails viriam abrandar a solidão dos anciãos. Mas, vamos aos fatos. Dia desses, resolvi abrir todas as mensagens que me enviaram. Ao todo, foram 167! Levei quase um dia completo para abri-las, e, findei, lacrimejando os olhos e com dores nas costas. Fora aqueles, apaguei, também, os e-mails suspeitos de conter vírus.
Dentre os e-mails, havia um, de um conhecido meu, contando como foi inventada a maionese. Vinha em anexo: Uma das primeiras vitórias francesas durante a Guerra dos Sete Anos (1756-1763), contra os ingleses. A mensagem expunha a conquista da ilha de Menorca, nas Baleares, até então dominada pelos britânicos, que, em 1708, a haviam tomado dos espanhóis. No dia 17 de abril de 1756, as sentinelas inglesas de Menorca avistaram, no horizonte, 197 velas. Elas representavam a frota fr ancesa, comandada pelo Almirante La Galissonière, e, em cujo navio (chamado Foudroyant) se encontrava o Duque de Richelieu - Louis François Armand Vignerot du Plessis (1696-1788) – o comandante das forças de desembarque.
Conquistada a ilha, o Duque visitou Puerto Mahón, capital de Menorca. Foi lá onde conheceu um molho feito com azeite de oliva e gema de ovo, que os nativos usavam para temperar peixes. O nobre gostou tanto dele que levou a receita para seu país. Chamou o molho de sauce mahonnaise ou molho de Mahón. Logo, ele ficou conhecido como salsa mayonesa, em países de língua espanhola, e passou, para a língua po rtuguesa, como “molho de maionese”.
Já uma outra versão ressalta que a maionese foi inventada, em 1756, pelo cozinheiro chefe do Duque de Richelieu. Após derrotar os ingleses em uma batalha, na cidade portuária de Mahon, foi organizado um banquete onde seriam preparadas receitas à base de ovos e leite. Quando o cozinheiro percebeu que não havia mais leite, decidiu substituir o ingrediente por azeite, misturado com ovos, o que resultou em um novo molho. E em homenagem à vitória daquele Duque, o molho foi denominado mahonneise.
Ao acabar de ler o e-mail, respondi ao meu conhecido que ele estava enganado, e que a história da maionese era outra, relacionada à retirada, da Rússia, do exercito de Napoleão. O imperador tinha achado estranho um soldado, de sua guarda pessoal, não reclamar da ração diária recebida. Isto porque, de vez em quando, recebia um ovo cru e, ao invés de aborrecido, ficava muito feliz. Intrigado com o soldado, Napoleão procurou saber o motivo daquela alegria. Ao que o soldado respondeu: “Sir, eu bato o ovo cru com azeite e um pouco de farinha de trigo, e fica uma delícia”. Dessa forma foi inventada maionese. Dizem ainda que, chegando a Pari s, aquele soldado abriu um bistrô onde a maionese se tornou o carro-chefe. Ele patenteou a descoberta e as fabricas de maioneses, até hoje, pagam royalties aos seus herdeiros.

*Diario de Pernambuco em 11 de março de 2010

PASSEI NO VESTIBULAR


PASSEI NO VESTIBULAR

Meraldo Zisman
PSICOTERAPEUTA




Choram os docentes, do alto e do baixo clero universitário, ativos e inativos (aposentados). Coincidentemente ou não, escrevo estas linhas em uma terça-feira de carnaval, quando a folia já está mais perto de baixar, e os nobres e a plebe, os ricos e os pobres, os governantes e os eleitores retornam à realidade do cotidiano. Quero lembrar, aqui, o estudante Alcides do Nascimento Lins, assassinado no dia 5 de fevereiro de 2010, aos 22 anos de idade, e perguntar aos meus leitores: de que vai adiantar a morte dos Alcides, junto àqueles que driblam a miséria e passam no vestibular?
Podem verter enxurradas de prantos, homenagens, crônicas, reportagens, missas, atos públicos, que de nada adiantará. Minha tese, acreditem, é a de que falta Educação no Brasil. Isto porque, em verdade, os poucos jovens marginalizados pela pobreza que chegam à Universidade e rompem a barreira da miséria são mortos, assassinados, moral ou fisicamente, cedo ou tarde, como o Alcides, filho de uma catadora de lixo.
A maioria daqueles jovens ainda acredita em nós, professores, quando dizemos: “estudem bastante para poder sair da miséria material e mental, e, desse modo, poderão ser aproveitados no mercado de trabalho”. É triste o país que faz dos seus jovens as maiores vítimas das mortes matadas, das mortes morridas, das mortes não vividas, os mártires das injustiças psicossociais. O assassinato em questão não ocorreu dentro dos muros universitários!
Quem pensa que o problema de Educação se resolve, exclusivamente, dentro das escolas, está enganado. É equivalente a um nobre, na Idade Média, julgar estar protegido do clamor dos súditos, por meio de fossos, muros, ou pontes levadiças nos castelos. Como os poderosos podem pensar em ter, como defesa do poder, o uso da tecnologia, sem melhorar a condição humana?
Não importam os tipos de defesas, as cercas eletrificadas, os sensores, as câmaras de vigilância, a internet, as seguranças particulares, todos esses paredões de nada valem quando a injustiça social penetra nas paredes de taipa de uma escola do interior, ou nos muros da Universidade. E há quem acredite, ainda, que a escola é o segundo lar, quando se sabe que o primeiro jamais existiu. O jaleco que a mãe de Alcides vestia, no dia em que foi à delegacia para depor, é o emblema da enganosa política sócioeducativa e caritativa brasileira.
Quando é que vamos entender que um diploma não é um passaporte para a cidadania?
Um dos sambas que Martinho da Vila canta continua sendo bastante atualizado: Felicidade! Passei no vestibular, mas a faculdade é particular. Particular, ela é particular; particular, ela é particular... Livros tão caros, tanta taxa prá pagar; meu dinheiro muito raro, alguém teve que emprestar...
Dizem que o Brasil é um país sentimental, além de ser musical. Seja lá como for, é importante deixar claro que lágrimas não servem para ressuscitar ninguém. É preciso muito mais do que isso!

*CRÔNICA PUBLICADA EM 25 DE FEVEREIRO DE 2010:
DIARIO DE PERNAMBUCO - CADERNO OPINIÃO
E DIRETO DA REDAÇÃO

EM DEFESA DE UMA CERTA ANSIEDADE


EM DEFESA DE UMA CERTA ANSIEDADE

Meraldo Zisman
Psicoterapeuta



A ansiedade pode ser sinal de coisa boa? Desde que o mestre Sigmund Freud afirmou ser a causa das neuroses, ela passou a ser vista como maligna, quando deveria ser considerada como uma das defesas para a perpetuação da espécie. Os dicionários definem ansiedade como uma sensação de aflição, receio ou agonia, sem causa aparente; inquietação ou impaciência acarretada por desejo ou vontade, traduzido por um estado afetivo penoso, pela expectativa de algum perigo que se revela indeterminado e impreciso, e diante do qual o indivíduo se julga indefeso. A maioria dos psicólogos considera a ansiedade como uma atitude emotiva concernente ao futuro, marcada por vaivens entre o medo e a esperança.
Acredito que qualquer que seja o conceito atribuído, ele deveria ser encarado de outra maneira, antes de ser tido como patologia. A ansiedade muda com o “espírito da época”, ou seja, com o conjunto da atmosfera intelectual e cultural vigente, em determinada fase da História. Os exemplos são numerosos. No século passado, por exemplo, a ansiedade estava associada ao problema do holocausto atômico - o Day After, tema que atemorizava a todos.
Passada a Guerra Fria, a ansiedade ficou associada à questão do desemprego, das crises econômicas, dos terremotos, do aquecimento global, da poluição, do terrorismo, da violência, das migrações, das guerras localizadas, entre outros problemas que sensibilizam ou venham a sensibilizar. E os meios de comunicação, em particular, sabem como ninguém comandar as ansiedades da ocasião.
Considerando-se a ansiedade, por si só, creio que, para o homem das cavernas, o medo do aparecimento do tigre de dentes de sabre deve ter sido bem mais estressante, do que hoje, o medo dos assaltantes e bandidos. O mecanismo referente ao estresse permanece o mesmo. Em outras palavras, diante do perigo, todos nós somos iguais. O grau de resposta é que varia de uma pessoa para outra.
No século XVI, o maior medo era o de ser queimado vivo, por problemas de crenças religiosas (como a Inquisição), dívidas, ou doenças como a peste negra. Quanto aos açoites e torturas, estes permanecem no tempo. O medo de errar, de se sentir culpado, frustrado ou envergonhado, fazem parte da condição humana. Desconheço civilização onde alguém sobreviva sem sentir algum grau de ansiedade. Contudo, ela passa a ser um problema quando atinge um estado psíquico de intranqüilidade permanente, de agitação, de temor diante de uma ameaça real ou imaginária. Ainda assim, só será problema para quem acha que ela é um problema. E esses não estão adaptados para viver a vida de uma maneira menos ansiosa (devido a causas psíquicas ou fisiológicas).
Será que os evolucionistas não percebem que, na luta vital contra os predadores, a presença de indivíduos, apontados como ansiosos, foi decisiva? A ansiedade foi e continua sendo uma necessidade adaptativa à sobrevivência da espécie. O problema é saber delimitar seu diagnóstico. Faz-se necessário cuidado com as rotulações do poder médico. Quantos gênios não estariam confinados em manicômios, se a ansiedade fosse considerada uma patologia?

SALVEMOS OS PEDIATRAS E O HAITI


SALVEMOS OS PEDIATRAS E O HAITI

Meraldo Zisman

Psicoterapeuta




Apesar de a notícia da vez ser o terremoto do Haiti, tragédia merecedora da Solidariedade Humana e outros bla-blas, estranho é o fato de a mídia nacional, sempre tão atuante, não mencionar, nem de raspão, a falta de pediatras para atender aos brasileirinhos. Quantos leitores sabem deste fato? A Sociedade Brasileira de Pediatria, no meu tempo de atividade a mais numerosa entidade médica do Brasil, denuncia que um dos carros-chefes do Ministério da Saúde, o Programa Saúde da Família, não valoriza o profissional de Pediatria. O problema atinge, até, a nossa Versalhes (Brasília). A cena de Dante dos hospitais públicos repete-se na esperas pediátricas da rede particular. Não quero dizer que esse seja, exclusivamente, o motivo, mas como a maioria das crianças não ne cessita de procedimentos complexos nem de exames complementares, não há lucro pecuniário como, por exemplo, na Cardiologia, onde a consulta exige, no mínimo, um teste de esforço e um eletrocardiograma, cujo valor pode saltar para até R$ 200. Estou escrevendo enfatizando o lado econômico, pois a expropriação da Medicina é um fato na Sociedade atual. Democraticamente, a bagunça da medicina nacional (da criança), atinge precocemente tanto o setor publico quanto o setor privado — democraticamente.
Os acadêmicos de medicina, sabedores de como funciona o mercado de trabalho que irão enfrentar, optam por outras áreas, mais rendosas, que exigem melhor remuneração e menor dedicação: cirurgia plástica, dermatologia, oftalmologia, radiologia — sintomaticamente as mais procuradas nos concursos para a residência médica. Como professor titular aposentado pioneiro da Neonatologia Brasileira resta-me acautelar a quem de direito: da maneira como o barco vai, a Pediatra Brasileira é um animal em extinção. Como antigo Pediatra (hoje, sou psicoterapeuta), advirto: a criança é o pai do Homem e o pediatra seu advogado. E como (TUDO INDICA) iremos mandar equipes médicas para atender a vitimas do terre moto do Haiti, como seriam tais equipes, sem médicos de criança? Talvez esforços feitos para a não extinção desses especialistas sejam um bom elemento de marketing para a campanha nacional da crônica candidatura do Brasil a um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas. É uma simples lembrança e uma sugestão de um médico de província. Desculpem qualquer coisa... de falar de política externa.

ARTIGO PUBLICADO NO DIARIO DE PERNAMBUCO - CADERNO OPINIÃO - PAG, A 19 - RECIFE, QUINTA FEIRA, 28 DE JANEIRO 2010

ONIOMANIA


ONIOMANIA

Meraldo Zisman
Psicoterapeuta de Jovéns


A palavra oniomania significa mania de consumir, compulsão em comprar. Até hoje, na verdade, não se sabe se essa epidemia torna-se mais intensa devido à tradição natalina, ou se é impulsionada pela da esperança de renovação, que surge em cada véspera de Ano Novo. Nesta época, a febre de consumo toma conta das pessoas, nas catedrais da modernidade - os grandes shoppings centers - e eles ficam abarrotados de “fiéis”, compelidos pela ânsia de presentear os familiares e amigos.
A mania que se encontrava latente pode eclodir, até, nas pessoas menos predispostas ao consumismo. Cabe aqui um alerta: não devemos esquecer os “surtos” menores, impulsionados, também, pelo comércio, a exemplo do Dias das Mães, do Dia dos Pais, do Professor, da Sogra, da Mulher, da Secretária, entre tantos outros. Sentir necessidade de comprar é um sinal de doença. Estourar o orçamento, repetidas vezes, representa um vício semelhante ao alcoolismo. Esse distúrbio não é novo. Dizem que teve seu início na Grécia Antiga, após a invenção do dinheiro e do surgimento do status (o conjunto de direitos que possuem aqueles que têm poder de barganha). Não raras vezes, a ação de comprar promove grande sensação de prazer, que acarretam em descargas de endorfina.
No principio do século passado, dois psiquiatras - o alemão Emil Kraepelin (1856-1926) e o suíço Eugen Bleuer (1857-1939) - foram os primeiros a escrever sobre a questão da compulsão por comprar, ou oniomania, uma dificuldade para controlar o impulso de adquirir bens materiais. O distúrbio psicossocial tornou-se cada vez mais global, apesar de a Organização Mundial da Saúde (OMS) não incluí-lo na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10). Somente na década de 1990 surgiram alguns artigos sobre o assunto. Devido à gravidade pandêmica do distúrbio, vale questionar se esse comportamento ainda não foi incluído, como doença, pela OMS, em decorrência do poder do mercado consumidor. Será, também, que, devido às pressões exercidas pelo mercado, a importância psicossocial da oniomania vem caindo no esquecimento da literatura especializada?
Dificilmente se encontrará, na Medicina, remédio, diagnóstico ou tratamento para tal patologia. Ela vem sendo muitíssimo bem alimentada, a cada ano que passa, pelas sociedades que incentivam o consumismo, o narcisismo, o egocentrismo, em detrimento de outros valores e comportamentos. E, nessa lógica diabólica, ter que comprar, ter que presentear torna-se imprescindível. As pessoas se endividam e adquirem todas as mercadorias produzidas que foram transformadas, por parte do mercado, em bens fundamentais. Ou seja, não importa o que se compre: o mais importante passou a ser o próprio ato de comprar! E, cada vez, mais...