sábado, 24 de abril de 2010

ONIOMANIA


ONIOMANIA

Meraldo Zisman
Psicoterapeuta de Jovéns


A palavra oniomania significa mania de consumir, compulsão em comprar. Até hoje, na verdade, não se sabe se essa epidemia torna-se mais intensa devido à tradição natalina, ou se é impulsionada pela da esperança de renovação, que surge em cada véspera de Ano Novo. Nesta época, a febre de consumo toma conta das pessoas, nas catedrais da modernidade - os grandes shoppings centers - e eles ficam abarrotados de “fiéis”, compelidos pela ânsia de presentear os familiares e amigos.
A mania que se encontrava latente pode eclodir, até, nas pessoas menos predispostas ao consumismo. Cabe aqui um alerta: não devemos esquecer os “surtos” menores, impulsionados, também, pelo comércio, a exemplo do Dias das Mães, do Dia dos Pais, do Professor, da Sogra, da Mulher, da Secretária, entre tantos outros. Sentir necessidade de comprar é um sinal de doença. Estourar o orçamento, repetidas vezes, representa um vício semelhante ao alcoolismo. Esse distúrbio não é novo. Dizem que teve seu início na Grécia Antiga, após a invenção do dinheiro e do surgimento do status (o conjunto de direitos que possuem aqueles que têm poder de barganha). Não raras vezes, a ação de comprar promove grande sensação de prazer, que acarretam em descargas de endorfina.
No principio do século passado, dois psiquiatras - o alemão Emil Kraepelin (1856-1926) e o suíço Eugen Bleuer (1857-1939) - foram os primeiros a escrever sobre a questão da compulsão por comprar, ou oniomania, uma dificuldade para controlar o impulso de adquirir bens materiais. O distúrbio psicossocial tornou-se cada vez mais global, apesar de a Organização Mundial da Saúde (OMS) não incluí-lo na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10). Somente na década de 1990 surgiram alguns artigos sobre o assunto. Devido à gravidade pandêmica do distúrbio, vale questionar se esse comportamento ainda não foi incluído, como doença, pela OMS, em decorrência do poder do mercado consumidor. Será, também, que, devido às pressões exercidas pelo mercado, a importância psicossocial da oniomania vem caindo no esquecimento da literatura especializada?
Dificilmente se encontrará, na Medicina, remédio, diagnóstico ou tratamento para tal patologia. Ela vem sendo muitíssimo bem alimentada, a cada ano que passa, pelas sociedades que incentivam o consumismo, o narcisismo, o egocentrismo, em detrimento de outros valores e comportamentos. E, nessa lógica diabólica, ter que comprar, ter que presentear torna-se imprescindível. As pessoas se endividam e adquirem todas as mercadorias produzidas que foram transformadas, por parte do mercado, em bens fundamentais. Ou seja, não importa o que se compre: o mais importante passou a ser o próprio ato de comprar! E, cada vez, mais...



O MELHOR PRESENTE DE NATAL E ANO NOVO


O MELHOR PRESENTE DE NATAL E ANO NOVO

Meraldo Zisman


O ano de 2010 se aproxima. Será um ano eleitoral. Vamos escolher novos (ou, os mesmos) governantes. O Sistema Republicano, mais conhecido como Democracia, exige, entre outras coisas, a alternância do Poder. Isto seria a melhor forma de governo, o que concordo plenamente! Mas, como tudo que é inventado pelo Homem, tem pontos fracos e, um deles, diz respeito ao seu calcanhar de Aquiles: o Colégio Eleitoral. Quem o elege? E, quem são os eleitores?
Como profissional da área de Psicologia, vejo, com grande apreensão, o aumento da influência da tecnologia midiática nas próximas eleições brasileiras. O exemplo de Joseph Goeb bels (1897 -1945) representa um fato histórico marcante. Recordo aqui, para quem não se lembra: ele foi o Ministro do Povo e da Propaganda da Alemanha Nazista. Em outras palavras, controlava todos os meios de comunicação de massa, tais como r ádios, livros, revistas, jornais, teatros. Se, na época, isto teve um impacto terrível, imaginem os leitores tal fato ocorrendo, hoje, quando os marqueteiros politicos dispõem de elementos bem mais modernos, como televisão, blogs, tweeters, entre outras parafernálias eletrônicas presentes.
Os meios de comunicação de massa – industrialmente, muito bem estruturados - atingem todas as classes sociais e, em particular, as menos favorecidas, que são as mais vulneráveis. Isto significa que as mensagens produzem, na mente dos espectadores, efeitos diversos, de acordo com sua condição psicossocial e cultural. Principalmente aquelas veiculadas pela televisão, que atingem a maior parte da população: a que possui menor grau de escolaridade.
Com frequência, não nos damos conta de que a mente produz decodificações (a passagem de uma linguagem codificada para uma mais comum e acessível) necessárias para a compreensão imediata do que está sendo transmitido. Assim sendo, a televisão chega às mentes e aos lares sem pedir licença e sem qualquer censura. O que se observa na tela vai direto para o lobo frontal e se instala, também, no inconsciente. Tudo se passa como se as pessoas vivessem em um gigantesco big-brother.
É oportuno salientar, por uma questão de justiça, que a mídia pode vir a ser a maior guardiã da Democracia. Contudo, seu poder é tamanho que, o país, corre o risco de pertencer, tão-somente, aos detentores dos meios de comunicação.
Neste dezembro de 2009, e no ano eleitoral que se aproxima, o povo brasileiro merece ganhar um verdadeiro presente de Natal e Ano Novo: uma blindagem de Moral e Ética construída pelos profissionais de Jornalismo. É somente isso que este psicoterapeuta - pernambucano e judeu - pede a Papai Noel para o Brasil. Seria o melhor presente cívico já proporcionado à Nação!



ADESG - Rotary Clube-- Encruzilhada e Caxangá



ATIVIDADE DE ADESG

Rotary Clube-- Encruzilhada e Caxangá

20 de novembro de 2009


Senhoras e Senhores: até quando vamos nos calar?

Meraldo Zisman



Fui convidado pelo rotariano Pedro Brasil, estagiário do XXXVI Curso de Estudos de Política e Estratégica – CEPE, da Delegacia da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG), para falar sobre assuntos referentes à brasilidade, no mês da Proclamação “Oficial” da República: dia 15 de novembro de 1889. Vênia para dividir minha fala em três vertentes: a) ESG/ADESG; b) Proclamação da República; e c) Pernambuco. Peço licença para empreender uma breve digressão e registrar que, todo e qualquer episódio, da História, possui datas e acontecimentos emblemáticos, seja a Queda da Bastilha, a Derrubada do Muro de Berlim, ou a 2ª. Guerra Mundial.
Destaco, em primeiro lugar, a importância do convite do Rotary. Meus agradecimentos pela honra e a oportunidade de fazer-me presente junto àqueles que integram o Rotary Clube do Caxangá e da Encruzilhada. E afirmar que, aqui, tenho o prazer de encontrar e reencontrar tantos rostos já conhecidos. Como, no momento, estou Delegado da Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra, peço licença aos prezados rotarianos, convidados e convivas, para fazer um breve histórico dessa Universidade, cuja função precípua é estudar o Brasil.

a) ESG/ADESG- Há sessenta anos, o então Presidente da República Eurico Gaspar Dutra criou, através de uma resolução legislativa, a Escola Superior de Guerra (ESG). Integrante da estrutura do Ministério da Defesa, e destinada a desenvolver e a consolidar os conhecimentos necessários ao exercício de funções de direção e assessoramento superior, para o planejamento da Defesa Nacional, dentre os seus ensinamentos estão incluídos aspectos fundamentais da Segurança e do Desenvolvimento do país. A ESG é um Instituto de Altos Estudos de Política, Estratégia e Defesa, cuja função é estudar o Brasil em todas as suas expressões.
Por sua vez, a Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG) foi fundada no dia 7 de dezembro de 1951, por Diplomados do Curso Superior de Guerra, da turma de alunos de 1950, da ESG. Sua estrutura é composta por uma Administração Nacional, situada no Rio de Janeiro; por vinte e nove Delegacias (sendo vinte e sete localizadas nas capitais das Unidades Federativas e, duas, no Triângulo Mineiro); além de cerca de cem Representações, em cidades importantes de nosso país, que contam com, aproximadamente, 80.000 associados em território nacional. Até o presente momento, a ESG diplomou em torno de 8.000 integrantes.
O papel da ADESG é de extrema relevância. Como ela possui grande capacidade de projeção no país, seus preceitos são difundidos por meio de Cursos de Estudos de Política e Estratégia (CEPE), bem como de outras atividades sociais e culturais, que são promovidos, a cada ano, com o apoio da ESG. Nossa missão, no aqui e agora, é estar e continuar presente na dinâmica da vida da Nação.

b) Proclamação da República

Oficialmente, a República foi proclamada no dia 15 de novembro 1889, na cidade do Rio de Janeiro, então capital do Império. Esta é a data oficial e emblemática, tal qual o grito de Independência.

c) Pernambuco

No período de trinta e um anos, ocorreram três revoluções em Pernambuco: a de 1817, conhecida como Revolução Pernambucana (ou dos Padres); a de 1824 (conhecida como Confederação do Equador); e a Revolução de 1848 (chamada de Praieira). Após essas revoluções, sofremos grandes amputações em nosso território, onde perdemos mais da metade das terras. Isto sem falar nas perdas sociais, com milhares de revolucionários e combatentes mortos porque traziam como bandeiras os ideais republicanos, tecidos pela Revolução Americana de 1776, e pela Revolução Francesa de 1789. Naquelas manifestações sociais, a mentalidade coletiva dos pernambucanos se fortalecia com os ideais do Federalismo, um rio caudaloso que corria nas veias de Frei Caneca, do General Abreu e Lima, e do pensamento moderado de Gervásio Pires.
Tomando a Revolução de 1817, como exemplo, gostaria de relembrar o seguinte. No começo do século XIX, Olinda e Recife, as duas maiores cidades do Estado tinham, juntas, cerca de 40.000 habitantes (comparados com os 60.000 do Rio de Janeiro, capital da Colônia). O Porto do Recife escoava a produção de algodão, e grande produção de açúcar, oriunda de centenas de engenhos da Zona da Mata. Em outras palavras, Pernambuco possuía uma grande importância econômica e política, e os pernambucanos participaram de várias lutas libertárias. A primeira (e mais importante) foi a Insurreição Pernambucana, em 1654. Depois, veio a Guerra dos Mascates, e a possibilidade da proclamação da independência de Olinda. Na Cidade Alta, de Olinda, lê-se uma placa com os dizeres: Aqui, em 10 de novembro de 1710, Bernard o Vieira de Melo deu o primeiro grito em favor da fundação da República entre nós. O Hino de Pernambuco, em seu verso de número 4, registra o fato, no seguinte poema:

A República é filha de Olinda

Alva estrela que fulge e não finda

De esplender com seus raios de luz.

“Liberdade”, um teu filho proclama:

Dos escravos, o peito se inflama,

Ante o sol dessa terra da Cruz!”



Em 1981, o Prefeito Germano Coelho, através de um Decreto, concedeu a Bernardo Vieira de Melo o título de Precursor da República no Brasil e nas Américas, título que corresponde àquele dado a Tiradentes, com relação à Inconfidência Mineira. O povo de Pernambuco é, antes de tudo, forte e corajoso, no enfrentamento das adversidades.

BULLYING EM PERNAMBUCO


BULLYING EM PERNAMBUCO

Meraldo Zisman


Acontece um reboliço em nossa cidade. Bullyng é a sua manchete. Seria, por acaso, alguma nova pandemia da gripe suína? Calma, leitor. Deixe-me explicar.
O verbete inglês bullying (intraduzível palavra para o nosso vernáculo) é empregado para descrever atos de violência física ou psicológica, intencionais e repetidos, praticado por um indivíduo considerado “valentão”, que utiliza o mesmo idioma; ou por um grupo de alunos, com o objetivo de intimidar ou agredir outro(s) colega(s) incapaz(es) de se defender no ambiente escolar.
Os pais estão apavorados com mais esta violência e, os professores, desorientados e temerosos. Pessoas competentes na área de Educação, donos de colégios, políticos, autoridades, pediatras, psiquiatras, psicólogos, professores e magistrados são mobilizados, quando o fato aparece em estabelecimentos de ensino.
Em escolas públicas ou privadas, a maioria dessa violência passa despercebida, para quem não deseja enxergar o óbvio. Há sinais, indiretos e diretos, denunciadores. Tal modalidade de selvageria sempre existiu, apenas é subnotificada, seja por pretextos de ordem política, pública ou privada.
Um episódio do bullying veio à tona, envolvendo um conhecido educandário, e uma jornalista me telefonou, indagando: “O que o senhor acha, como psicoterapeuta de jovem, sobre a sentença de um Juiz, punindo severamente um desses agressores? O jovem mal completou 14 anos e o que vai acontecer se ele for preso junto com drogados e homicidas?”
Ao que lhe respondi: “Em decorrência da complexidade do tema, eu não poderia emitir uma opinião e aprendi que sentença de Juiz é para ser cumprida e, depois, discutida”. Com essa postura frente à matéria, a jornalista omitiu o meu nome, e tampouco publicou minha explanação improvisada. Esta é, portanto, a razão da presente croniqueta.
Via de regra, o(s) Magistrado(s) procura(m), em primeira instância, afastar o(s) agressor(es) do ambiente onde vive(m). Ao mesmo tempo, não desconhecem a precariedade das atuais regras penais.
Por dever de oficio, são vinculados a aplicar uma pena correcional ao(s) criminoso(s)/infrator(es), em reposta/defesa/profilaxia à sociedade, como pessoa(s) da Lei, apesar de, a maioria, estar ciente da precariedade correcional da pena aplicada.
Cabe ressaltar, no entanto, que jovens com condutas antissociais são fruto da sociedade em que estão engajados. É ela a responsável pela criação dos seus marginais. Sendo assim, faz-se necessária uma discussão ampla e pontual sobre o bullying. Tal discussão precisa ser mais que multidisciplinar, eu diria, tem que ser transdisciplinar dos saberes existentes. Apenas importar soluções de outros países, ou mesmo, de outros Estados, sem as devidas adequações, é bastante temeroso, uma vez que existe toda uma cultura local, com suas especificidades.
Portanto, devemos trabalhar para obter uma reposta para estes casos, dentro de nossa realidade. Devemos permanecer permeáveis, ainda, às medidas praticadas nas demais latitudes. É isto que o Diário de Pernambuco está procurando realizar, com seu Grupo de Estudos Contra a Violência, dentro dos muros das escolas, bem como nas periferias em que elas penetram.
Muito em breve, creio eu, deverá surgir uma indefectível Organização Não Governamental (ONG) especializada em violência escolar!

Bullying // Diários Associados vai discutir violência escolar




Bullying // Diários Associados vai discutir violência escolar

Muitas vezes escondido e restrito aos corredores das escolas, o fenômeno bullying agora está no centro das discussões dos educadores pernambucanos. Tudo graças a denúncias feitas por pais de oito alunos de uma escola particular da Zona Norte do Recife, na semana passada. Ciente de que, além de noticiar os fatos, a imprensa também deve cumprir seu papel social, o grupo Diários Associados promove na próxima sexta-feira, às 15h, uma mobilização em torno da violência escolar. O encontro acontece no auditório dos Diários Associados, no bairro de Santo Amaro, e é aberto a professores, diretores, pais e alunos. Na reunião, será criado o 1º grupo de estudos com foco em bullying do estado. Além de diagnosticar e identificar as características desse tipo de agressão nos colégios locais, a ideia é construir soluções eficazes no combate à violência em ambiente escolar.


Meraldo Zisman coordenará evento junto com diretora do Leitor do Futuro. Foto: Juliana Leitão/DP/D.A Press
A coordenação do grupo será dividida entre o pediatra e psicoterapeuta Meraldo Zisman e a diretora do programa Leitor do Futuro, dos Diários Associados,Conceição Cavalcanti. "No momento em que o bullying ganhou repercussão, é preciso fazer alguns questionamentos. Será que o problema da violência na escola está na criança ou no adolescente agressor? Será que o problema está na escola? Ou será que vem de casa? Com a criação do grupo de estudos, queremos saber sobre a nossa realidade, através de pesquisas, não de achismos", justificou Zisman, especialista em violência familiar e escolar. Ele participará de um chat amanhã, às 10h, no portal www.pernambuco.com.

Os interessados no encontro podem se inscrever pelo e-mail leitordofuturo.pe@diariosassociados.com.br ou através dos telefones 2122.7580 ou 2122 .7862, até as 19h de amanhã. As inscrições são gratuitas e voltadas a todos os profissionais de educação, além de pais e estudantes. "Os professores e diretores que vierem responderão a questionários, para a partir daí formarmos a equipe que estará à frente das pesquisas. Todos serão bem-vindos", afirmou Conceição Cavalcanti. O bullying, termo inglês utilizado para descrever as agressões entre alunos, foi criado em 1920. Ele é observado tanto em escolas da rede pública quanto em unidades da rede privada. Até meados do século passado, era um fenômeno escondido pela maioria das vítimas.

Sorria, você esta sendo filmado



SORRIA, VOCÊ ESTA SENDO FILMADO

Meraldo Zisman

Médico-psicoterapeuta


Foi a impressão que tive quando li a entrevista das “páginas amarelas”, na Revista Veja (14/10/2009), intitulada Caixa-Preta na Cirurgia, com o cirurgião paulista Dr. Ben-Hur Ferraz Neto, 47.
Apesar de minha longa carreira profissional com pediatra e atualmente como psicoterapeuta, o estresse diuturno da/na atividade cirúrgica é de estremecer. O entrevistado trabalha em um dos principais hospitais brasileiros. Concordo quando afirma que, por mais que a tecnologia evolua, jamais será capaz de controlar todas as inúmeras variáveis envolvidas num ato cirúrgico.
Na verdade, inexiste ação humana capaz de garantir em 100% o êxito ou a segurança, e muito menos máquinas competentes para reproduzir a vida do paciente em tempo real, com a pulsação, o sangue correndo pelas veias do paci ente e o movimento dos órgãos, isso sem falar da equipe cirúrgica.
Também estou de acordo com o entrevistado quanto à necessidade de o médico-cirurgião possuir uma personalidade resoluta, o que lhe permita tomar decisões instantâneas e criativas para salvar a vida do paciente, além dos atributos de conhecimento, treinamento, etc. O que não abarquei foi a ênfase dada pelo entrevistado quanto ao valor da existência de uma Caixa Preta na sala de cirurgia!
Na aviação, tudo bem. Em geral, vários fatores estão envolvidos na queda de um avião, como erro humano, equipamento, condições atmosféricas, etc., e os registros servem à profilaxia da repetição de acidente semelhantes, apesar de não ressuscitar os mortos.
Já imaginou, leitor amigo, se o piloto colocasse em votação entre os comissários de bordo e os passageiros, se deve ou não realizar um pouso de emergência? Assim como o comandante de uma aeronave, um cirurgião trabalha com auxiliares de diferentes graus de conhecimento. Raros são os atos cirúrgicos em que não se necessite de ajudantes, todos sujeitos às mesmas condições de Humanos. Ou será que o cirurgião, por ser cirurgião, não teria a mesma condição dos demais mortais? O cirurgião seria algum deus?
Como psicoterapeuta, tenho a impressão de que todos nós temos lá o nosso momento emocional capaz de influenciar a conduta profissional. Por outro lado, já imaginaram a sensação de um cirurgião — ao levantar os olhos do campo operatório e deparar-se com uma câmera ou outra geringonça com o letreiro: “sorria, você esta sendo filmado”? Isso não tornaria o trabalho ainda mais estressante? Como reagiria um cirurgi� �o sabendo-se vigiado por um Big-Brother?.
Em lugar da caixa preta não faríamos melhor se tratarmos o “narcisismo doentio que pode acometer um cirurgião ou qualquer outra pessoa?”. Quando um familiar ou amigo meu tem de se submeter a uma cirurgia prefiro não entrar na sala, para que a equipe cirúrgica fique mais à vontade.
Esta entrevista terminou por lembrar-me a letra de um antigo samba do Billy Blanco(1924):
"(...) Pra que tanta pose doutor? Prá que este orgulho...? O infarto lhe pega doutor e acaba essa banca”.
Graças a Deus, quem me socorreu, na hora do infarto, foi a ponte de safena.
Gostaria de lembrar, para concluir, a todos ( médicos e leigos): A Medicina é a ciência das verdades transitórias...!

terça-feira, 9 de junho de 2009

COTAS RACIAIS

COTAS RACIAIS

Meraldo Zisman
PSICOTRAPEUTA DE JOVEM


Quando estudante de Medicina, ele foi apelidado pelos colegas de Chá Preto. O rapaz era filho de um guarda de tráfego (naquela época, a década de 1950, uma atividade denominada, oficialmente, inspetor de trânsito). O nosso colega residia com a família em um barraco, perto do lixão da Muribeca, uma área em que a hipocrisia dos mandatários insistia chamar de aterro sanitário, e na qual a sobrevivência dos catadores de lixo dependia da competição com os urubus.

Apesar de a Faculdade ser gratuita, o pai de Chá Preto jamais poderia sustentá-lo no curso de Medicina, se não fosse pelas aulas particulares de direção, ministradas àqueles que desejavam tirar a “carta de motorista”. Na época, não existiam auto-escolas, e, tampouco, uma repartição pública responsável pelo emplacamento e emissão de licença para se dirigir. Era o paraíso dos despachantes e, nessa área, o inspetor atuava com muita competência.

Quando chegou o quarto ano da Faculdade, todos nós começamos a correr e disputar um lugar de estagiário, sobretudo em serviços especializados. Residência Médica era algo que ainda não existia. E, para Chá Preto, nunca haveria uma vaga porque ele não possuía um “pistolão”, ou seja, não era filho de médico, não tinha um importante nome de família e, ainda por cima, era preto e pobre. O rapaz, entretanto, nunca esmoreceu: estudou muito, e foi aprovado (nas últimas colocações) em um concurso para acadêmico estagiário da Maternidade da Encruzilhada. Lá, fizeram uma entrevista que valia mais que a prova escrita.

Aquela Maternidade foi a verdadeira escola de Chá Preto, durante os dois últimos anos do curso de Medicina. Lá, ele aprendeu a fazer partos, curetagens, fórceps, e a auxiliar os médicos plantonistas em cesarianas e demais procedimentos clínicos cirúrgicos. Lá, ele se tornou amigo de um obstetra - o Dr. Aprígio, um moreno sertanejo, “caladão” - que, sem qualquer alarde, lhe conseguiu um contrato de médico da Prefeitura de uma pequena cidade, onde um dos seus parentes era o Prefeito. Este foi o presente de formatura de Chá-Preto, agora o Dr. Alcebíades Bezerra. Ele teve a sorte que ninguém mais teve, e foi o primeiro concluinte da turma a colar grau já empregado.

Quando chegou à tal cidadezinha, um dia, nem bem acabara de desfazer a mala - sua única bagagem, sem contar sua maleta de médico - foi chamado às pressas para atender uma parturiente. Ao entrar em seu barraco observou a seguinte cena: ela já estava exausta e, a parteira, descompensada. Rapidamente, o Dr. Alcebíades pegou as colheres do fórceps e conseguiu retirar a criança, ainda com vida. Do lado de fora do barraco, a multidão dava vivas ao doutor. A partir desse dia, sua popularidade foi crescendo tanto que ele foi convidado para entrar na política. Sua vocação, porém, era a Medicina.

Seus pagamentos eram feitos, na maioria das vezes, através de produtos hortigranjeiros, normalmente utilizados como moeda corrente em pequenas cidades. Apesar do parco salário que a Prefeitura lhe pagava (e, sempre, com atraso), ele procurou freqüentar congressos médicos e assinar revistas estrangeiras. Para lê-las, aprendeu inglês, por conta própria.

O Dr. Alcebíades casou com a filha de um comerciante local, uma moça branca, bonita, elegante e educada em colégio de freira. Ninguém, pelo que sei, foi publicamente contrário ao matrimônio. Verdade é que o diploma de médico “branqueou” o noivo!

A vida passava, nasceram-lhe dois filhos e morreu seu sogro. Ele vendeu o armazém e a terras do falecido e, com o dinheiro da pequena herança da esposa, mudou-se com a família para o Recife. Montou seu consultório em um edifício pertencente à high society, comprou a casa de um usineiro falido, no bairro do Espinheiro, e, diga-se de passagem, não lhe foi penoso constituir uma vasta e importante clientela. Adquiriu, ainda, um automóvel condizente com o status de médico. Seu carrão - uma “limusine” - era dirigido por um motorista alto, branco, de olhos azuis e trajado de forma impecável: o doutor assim o desejava.

Certa tarde, o carro estancou em plena Rua Nova, a rua mais importante do comércio recifense. E, havia pressa em se chegar à maternidade, porque uma das grávidas que eram assistidas pelo Dr. Alcebíades tinha entrado em trabalho de parto. Desceram do automóvel, nervosos, o motorista e o profissional de Saúde. Nisto, passou pela rua um mecânico, um tipo grandalhão e gordo, com uma barriga grande, mastigando um toco de charuto apagado no canto da boca.

Agoniado com a situação, o médico falou: eu acho que é o motor de arranque. Sem perguntar nada, o mecânico levantou o capô do carro e percebeu que o cabo da bateria é que estava frouxo. Ouvindo o comentário do médico, ele ficou aborrecido e, dirigindo-se ao motorista, disse com raiva, mordendo ainda com mais força o toco de charuto babado: Se não mandar esse nêgo calar a boca, eu deixo o senhor ir a pé! Quem já se viu um nêgo dar pitaco em assunto de branco?

Na hora, fez-se, apenas, um silêncio constrangedor. Apertado o cabo da bateria, o carro pegou na primeira tentativa, e o motorista dirigiu rumo à maternidade. Olhando a paisagem da cidade, o Dr. Alcebíades concluiu: Não há diploma no mundo que vença o preconceito!

Agora, eu pergunto: será que as tais cotas raciais, que andam apregoando para as universidades, não contribuem para aumentar o racismo? E rememorei, então, o sacrifício feito pelos pais de Chá Preto para formá-lo em Medicina.

Quando dei por mim, estava com os olhos cheios de lágrimas, lembrando os esforços que meus próprios pais fizeram para que eu me formasse. Ah! Que saudade danada eu tenho dos meus velhos!